Quarto da Franckie

Encolhi os ombros deixando a cabeça cair - para lado nenhum - murmurei olhando os meus dedos que ainda lhe davam festinhas no braço - estava só a vaguear pela minha cabeça, não quero mais ficar aqui, quero sair daqui - encolhi mais uma vez os ombros, não precisava de repetir aquilo já o tinha dito da outra vez e ela sabia-o - mas se quisesses era bom.

Na verdade, aquela pergunta tinha sido despropositada, eu sabia o que é que ele queria, ele queria sair dali, tal como eu e todos os outros. Cheguei-me mais para ele com um suspiro baixinho e fiquei a acariciar-lhe as costas, ao mesmo tempo que o sentia acariciar-me o braço.
- Mas eu quero.- disse quando me pareceu que ele duvidava disso.- é o que mais quero, fugir daqui contigo.- assegurei, apertando-o contra mim.- só tenho medo que eles nos apanhem.- encolhi ligeiramente os ombros, aninhando-me contra ele.- não quero que nos separem.

Encolhi os ombros quando disse que queria mas que tinha medo - eles vão apanhar-nos - disse-lhe - somos malucos e eu sou conhecido, basta ser fotografado uma vez e descobrem-nos - encolhi os ombros mais uma vez cruzando os braços ao peito - nunca tenho sorte, a minha mãe está sempre a estragar-me os planos - resmunguei mal humorado.

Acabei por levantar o olhar para ele, encostando o meu queixo no seu peito e fiquei a olhá-lo, suspirando com as coisas que dizia.
- Se eu pudesse, a primeira coisa que fazia era sair daqui contigo.- sussurrei.- mas tu sabes que o mais provável era eles separarem-nos se descobrissem, não sabes? - engoli em seco.- eu não quero isso.- abanei a cabeça e quando falou na sua mãe, o meu coração apertou-se. Ainda tinha esse assunto para resolver, e parecia-me estar longe do fim.- hmhm.- não disse mais nada, encostando a bochecha no seu peito e deixei-me ficar apenas encostada a ele.

Assenti com a cabeça ao que ela dizia, uma das razões pelo qual não a convencia a fugir comigo era essa, eu não queria separar-me dela, sabendo que ela era real, eu conseguia distinguir também as outras coisas, quando ela desaparecia eu nunca tinha a certeza e o medo conseguia consumir-me. Encostei-me a ela com um suspiro cansado - porque é que quando eu falo sobre a minha mãe tu só dizes "hmhm" ou qualquer coisa do género? - perguntei baixinho e claro, na minha mente comecei logo a fazer filmes.

Porque é que eu não os conseguia ajudar? Porque é que eu não conseguia nem ajudá-lo a ele nem à mãe? Porque tinha medo que ele se chateasse, eu sabia, mas eu devia conseguir não era? Soltei um longo suspiro, fechando os olhos durante uns segundos e logo os abri de repente quando ouvi a sua pergunta. Ele tinha reparado? Mordi a parte de dentro da minha bochecha com força, encostando-me mais a ele e subi o olhar para a sua cara devagarinho.
- Porque...- voltei a olhar para baixo.- não sei..às vezes pergunto-me se ela não está mudada.- engoli em seco.- eu acredito em ti.- disse logo.- eu juro que acredito, mas não achas que ela pode mudar?

Fiquei logo desconfiado quando ela começou e não acabou o que disse e olhei-a da mesma forma, mordendo o interior da minha bochecha. - Não - disse cruzando os braços ao peito - se ela não gostava de mim no início não gosta de mim agora que não me vê - disse olhando para os meus braços.

Algum dia eu tinha de falar com ele sobre isto, algum dia eu havia de conseguir fazê-lo. Podia ser que esse dia fosse hoje. Engoli em seco quando ele se afastou de mim para cruzar os braços ao peito e soltei um suspiro, sentando-me com alguma dificuldade, desviando o meu olhar para ele.
- Como é que tens tanta certeza Ethan? - perguntei, tentando de tudo para que ele não se chateasse.- quem te diz que isso não são só coisas das vozes? Tu sabes que elas já fizeram muita coisa.- encolhi os ombros.- também podem ter feito com que odiasses a tua mãe.

Levantei o olhar para ela quando se sentou e percebi que ela começava a não concordar comigo. Juntei as sobrancelhas quando perguntou como tinha tanta certeza e abri muito os olhos. Ela não acreditava em mim. Como é que ela podia dizer que as pessoas iam acreditar em mim se nem ela acreditava? - Eu sei o que ouvi - murmurei mordendo a parte de dentro do meu lábio - vou dar uma volta- disse no mesmo tom saindo da cama.

E pronto, o que eu mais temia aconteceu mesmo. Senti o meu coração apertar-se ao ver a forma como Ethan olhava para mim e decidi calar-me, ouvindo-o depois dizer que sabia o que tinha ouvido. Eu continuava a perguntar-me, como é que ele tinha tanta certeza.
- Eu..- ia dizer-lhe qualquer coisa quando se levantou de repente e disse que ia dar uma volta.- Ethan..- murmurei, já com o coração a palpitar-me no peito.- fica aqui, comigo, por favor.- pedi, esticando uma mão para ele.- vamos falar amor, eu acredito em ti.- assenti.- mas tenta perceber o que te estou a tentar dizer.- arrastei-me pela cama para me sentar na pontinha da mesma.- pode ser?

Estava quase a sair quando ela me chamou e praticamente me implorou para ficar com ele.
-Não fiques - olhei o quarto e depois Franckie abrindo mais a porta para voltar a entrar.
-Não, isso não é verdade - cruzei os braços - tu não acreditas em mim, estás a dizer que não foram as vozes mas eu sei que foram -fechei a porta atrás de mim e fiquei encostado à mesma.

Por um momento ainda tive esperança de que ele voltasse a entrar e viesse de novo para junto de mim, mas toda essa esperança se desvaneceu quando ele falou. O meu coração apertou-se e eu mordi de imediato a parte de dentro da minha bochecha com força, engolindo em seco. Eu já sabia, eu já sabia, ele ia ficar a odiar-me.
- Não, Ethan.. - tentei explicar-me, para que ele me percebesse, mas não me parecia que tivesse muitas hipóteses de isso acontecer. Suspirei, abanando a cabeça e saí da cama, sentando-me na minha cadeira. Subi o olhar para ele, vendo-o encostado à porta, e fui até ele, parando mesmo à sua frente.- eu acredito em ti.- murmurei.- eu juro que acredito.- entrelacei os meus dedos uns nos outros, de forma nervosa.- eu só não acredito nelas.

Abanei a cabeça durante muito tempo e apertei os braços contra mim como se me estivesse a abraçar a mim próprio. Encostei a cara ao ombro para limpar a humidade e encostei-me mais à porta. - Mas eu ouvi, ela disse - murmurei - eu juro que ela disse Franckie, ela não gosta de mim porque eu sou maluco - tentei acalmar a minha respiração, mas isso foi impossível. - Não estás a acreditar em mim porque eu estou a dizer que ela disse e tu não acreditas - olhei para o chão - e agora está toda a gente aqui.

Eu não conseguia mais, por mais que eu tivesse prometido à sua mãe que a ia ajudar, eu não conseguia vê-lo assim por minha causa, eu era incapaz de continuar com isto. Abanei a cabeça à medida que ele falava e aproximei-me mais um bocadinho, juntando as sobrancelhas. Ele estava a chorar, ele estava a chorar por minha causa.
- Eu acredito em ti.- murmurei.- eu acredito, eu juro que acredito.- aproximei-me ainda mais para lhe conseguir tocar.- esquece o que eu disse amor, eu acredito em ti, eu só acredito em ti.- engoli em seco, reprimindo a vontade que também tinha de chorar e passei uma mão pela cara, engolindo em seco.- quem é que está aqui?

Estava a passar pelo corredor quando ouvi vozes mais altas no quarto de Franckie. Fiquei logo com o coração nas mãos por causa da voz apavorada de Ethan. Bati à porta e espreitei lá para dentro vendo que Ethan estava perto da mesma e Franckie à frente dele a tentar acalma-lo.
-O que é que se está a passar? - perguntei fechando a porta atrás de mim.

Eu ia enlouquecer, eu ia finalmente enlouquecer e depois sim, ia ter razões para estar ali. Engoli em seco, perante a falta de respostas de Ethan e continuei a olhá-lo, com o coração a bombardear-me no peito.
- Ethan..- ia voltar a repetir tudo o que já tinha dito, que acreditava nele, quando a porta do quarto se abriu e Anne apareceu. Mordi a parte de dentro da minha bochecha com muita força, sentindo o meu queixo tremer e desviei o olhar de Ethan para ela.- a culpa é minha.- disse logo.

Dei um pequeno salto quando a porta se abriu e percebi que era Anne. Mordi a parte de dentro da bochecha com o queixo a tremer e com os olhos todos ensopados e abanei a cabeça - ninguém acredita em mim - murmurei limpando as bochechas quando as lágrimas cairam e olhei para Franckie apontando também para ela - ela disse que acreditava mas... - abanei a cabeça voltando a limpar as bochechas com mais força - ela não acredita - quase que não conseguia falar.

Olhei para os dois sem conseguir perceber o que se passava, só quando Ethan começou a falar é que eu percebi mais ou menos o que se passava. Franckie estava a ajudar a minha irmã em fazer o Ethan acreditar que ela o amava. Fui ter com ele por ser o que estava mais aflito e possivelmente com alucinações e puxei-o na minha direção passando a mão pelo seu cabelo quando ele se deixou abraçar. - Está tudo bem - olhei para Franckie e suspirei - tem calma está bem - dei-lhe também uma festinha na testa - vão-se os dois acalmar. Ethan, ela acredita em ti, tenta perceber o que ela quer dizer. - ele não reagiu ao que eu disse apenas limpou as bochechas e concentrou-se em respirar.

Eu ia matar-me depois disto, sentia-me a pior pessoa à face da terra. Eu já devia saber que era impossível ajudar a mãe dele, eu não conseguia fazer nada sem magoar uma das pessoas, e eu não queria magoar ninguém. Eu também tinha magoado os meus pais, aliás, eles tinham morrido por minha causa, já devia saber que não sabia fazer nada bem. Soltei um soluço quando as lágrimas começaram realmente a correr pelas minhas bochechas e depois de Anne se ter abraçado a Ethan, eu abracei-me ao meu próprio corpo, deixando que ela falasse com ele.
- Eu acredito em ti.- disse pela milésima vez.- eu só queria ajudar, eu sei como és infeliz por causa disto da tua mãe.- tentei que as palavras soassem como deve de ser, o que não foi muito fácil por também estar a chorar.- mas eu acredito em ti, eu amo-te, eu acredito.- abanei a cabeça, passando as mãos pela cara e depois olhei para Anne.- diga-lhe que eu acredito, ele tem de acreditar em mim.

Os dois choravam cada vez mal e apesar de estar a abraçar Ethan também devia estar a abraçar Franckie. Afastei-o para o olhar e limpei-lhe as lágrimas indo senta-lo na cama colocando a cadeira de Franckie ao lado. Suspirei passando as mãos pelo meu cabelo - Ethan, queres marcar uma consulta comigo para amanhã e falamos disto? - perguntei-lhe dando-lhe festinhas na mão que ele mantinha agarrada à minha. Vi-o encolher os ombros e assenti - se quiseres vai lá ter, tu sabes onde estou - olhei para Franckie - o mesmo para ti- dei também a mão a Franckie com um suspiro - agora acalmem-se os dois. Respirem fundo - esperei que o fizesse - está tudo bem Ethan, ela só te quer ajudar.

Eu sei que não devia deixar-me ir abaixo, precisava de estar bem para o ajudar, para o fazer acreditar em mim, mas a verdade é que eu não conseguia sequer pensar que ele achava que eu não estava do lado dele, isso não era verdade. Aliás, era precisamente por estar do lado dele e por querer o melhor para ele que eu estava a fazer isto. Funguei, passando as mãos pela cara e deixei que Anne me empurrasse para onde quisesse, não deslocando nem por um segundo os olhos de Ethan. Eu odiava-me por o ter posto naquele estado, mesmo que não tivesse feito de propósito. Assenti ao que Anne disse, tentando parar o meu queixo que tremia e agarrei na mão dela, respirando fundo, tal como me disse.
- Acredita em mim.- voltei a olhar para Ethan.- amor, eu estou do teu lado.- falei baixinho.- eu acredito em ti, eu juro que sim.- aproximei-me ligeiramente.- só estou a tentar ajudar, tu sabes que eu nunca faria nada que te prejudicasse ou que te magoasse.- disse, devagarinho, tentando fazer com que ele me compreendesse.

Olhei para o chão passando os dedos pela colcha da cama dela enquanto Franckie falava e assenti com a cabeça - assim porque é que dizes que acredita mas não acreditas quando eu digo que a minha mãe disse que não gostava de mim? - perguntei limpando mais uma vez a bochecha de forma brusca enquanto olhava os meus pés. - Eu disse que quando saísse daqui ninguém ia acreditar em mim e tu disseste que não, mas disseste acreditavas e agora... - abanei a cabeça confuso e limpei as lágrimas outra vez irritado. - eu só não percebo - murmurei.

Quando pensei que Ethan não ia dizer nada, ia apenas continuar a afastar-me por supostamente eu não acreditar nele, comecei a ouvi-lo falar. Reprimi o choro, recostando-me na cadeira e passei as mãos pelas bochechas enquanto o ouvia falar. Mordi o lábio com força, ao ouvir as coisas que ele dizia e abanei a cabeça com um suspiro, acabando mesmo por me aproximar dele quando se aproximou.
- Amor..- mordi a parte de dentro da bochecha com força e estiquei uma mão para a passar pelas suas bochechas, limpando-lhe assim as lágrimas.- eu acredito em ti.- voltei a dizer.- eu só perguntei aquilo porque eu sei como gostavas de ter uma boa relação com a tua mãe.- falei num tom baixo e calmo.- eu vejo como ficas quando falas dela.- encolhi ligeiramente os ombros, atrevendo-me a acariciar-lhe a bochecha.- mas eu acredito em ti.- assenti, tentando chegar-me o mais que conseguia para ao pé dele.- eu só estava a tentar que..- suspirei.- não sei, eu só quero que sejas feliz, sem todas estas coisas a atormentarem-te.- toquei-lhe no queixo para que me olhasse.- mas eu amo-te e acredito em ti.- senti o meu coração apertar-se.- acreditas em mim?

Fiquei calado enquanto ouvia Franckie falar e juntei as duas mãos enfiando-as entre as minhas pernas enquanto me mexia devagar para trás e para a frente inconscientemente. Não conseguia perceber como é que ela dizer que acreditava em mim e depois me vinha dizer que podia ser das vozes. Eu tinha ouvido! Eu lembrava-me de tudo como se tivesse acontecido à segundos atrás. Olhei-a quando me limpou a bochecha e depois me tocou no queixo e encolhi os ombros olhando depois para Anne que nos olhava com as sobrancelhas juntas. - Ethan - tentou Anne começar a falar comigo - A Franckie acredita em ti, só quer que sejas feliz e quer que tenhas uma mãe presente, é só isso.
-Ela nunca vai ser presente - murmurei.- ela já não vem há muito tempo - a enfermeira nunca mais me tinha avisado que tinha visitas.

A forma como reagia, ou melhor, não reagia aos meus toques estava a matar-me por dentro, apesar de eu saber que isto era em grande parte culpa minha. Nunca devia ter abordado o assunto daquela forma, se bem que não sabia como haveria de o fazer sem ser assim. Deixei a minha mão cair sobre o meu colo, quando o vi encolher os ombros, e olhei depois para Anne quando começou a falar, deixando que tentasse, visto que eu já não sabia o que dizer mais. Suspirei, mordendo a parte de dentro da minha bochecha com força e baixei o olhar para as minhas pernas, abanando a cabeça.
- Eu posso sair.- acabei por dizer, levantando depois o olhar de novo para Ethan.- se quiseres falar com a Anne sobre isto.- mordisquei o meu lábio.- pode ser que ela consiga fazer com que acredites em mim.- senti o meu queixo tremer.- porque eu nunca quis que ficasses assim, eu só queria tentar ajudar.